Contam que as duas rochas já foram só uma, com um enorme buraco ao centro. Sempre as conheci com a configuração actual: sólidas, servindo de separação entre as duas praias, com aquela enorme porta.
Nos anos 60, todas as famílias de veraneantes plantavam o seu toldo na praia principal e só o recolhiam no último dia de férias, por isso era natural que a preguiça de verão não os empurrasse para a segunda praia. Actualmente, em lugar de uma praia com pouca gente e outra desabitada, deparamos com dois areais cobertos de chapéus-de-sol e de gente estranha. À outra praia, íamos de vez em quando num passeio para desmoer o almoço e entreter a digestão ou para tomar um duche mais recatado na última fonte, subindo a escadaria de lajes cinzentas, abrasadoras ao sol , geladas à sombra. Encontrávamos um forasteiro ou outro, pescadores pacientes e largos tapetes de algas de odor iodado , salpicadas de mosquitos irrequietos.
Atravessar aquela fortaleza poderá ser uma aventura: enganar a rebentação na ida não significa que se consiga fazer o mesmo no regresso, o que nos obrigava a trepar as dunas e a dar a volta sobre a areia escaldante, já que a estrada para o Porto de Lapa de Pombas é obra dos anos oitenta.
A minha mais sombria recordação da rocha prende-se com um acidente com um banhista que foi fazer mergulho e que esteve dias desaparecido no mar, entre os tentáculos das algas compridas que tinham invadido a segunda praia. No dia em que o corpo deu à costa, colocaram-no no sítio mais fresco da praia... entre as duas rochas. Lembro a minha curiosidade patética de criança e o meu olhar sem reacção perante o corpo do homem que envergava o fato de mergulho, negro como as pedras. Nunca as transponho sem me recordar do frio do local e do gelo que irradiou para os olhares fúnebres da praia o corpo morto do homem, levado numa padiola dos bombeiros e acompanhado pela passada incerta do delegado de saúde.
Maria Filomena Ponte Silva
AInda me lembro do dia em que morreu este homem,mas que me faz recordar que tambem salvei um no mesmo local, era eu ainda um garoto com a minha prancha de bodYboard,recordacoes perdidas no tempo que este testo acima me veio avivar...SERGIO.
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ResponderEliminarÉ verdade, Sérgio. Há coisas que parecem perdidas, mas que facilmente recuperamos. É esse o objectivo deste blogue. Obrigada pela participação.
ResponderEliminarSó gostaria de referir que o meu avô foi um dos homens que ajudou a recolher o corpo... memórias!
ResponderEliminarMiguel
Essas pedras também sempre as conheci assim. E, transpunha-as sempre porque os meus pais gostavam da praia do fundo, quase sem ninguém e, onde nós ficávamos enquanto ele se ia entreter à pesca, nas rochas.
ResponderEliminarAs malditas algas que fala, iam-me sendo fatais já que eu praticava apneia, isto há cerca de 33 a 35 anos. Iniciado, mergulhando atrás de um peixe enorme, vi-me envolvido num dos túneis de algas, e foi com grande dificuldade que cheguei à superfície. Durante anos ganhei medo a mergulhar ali. Enfim, memórias...